terça-feira, 19 de abril de 2011

Vaquinha no precipício

Vaquinha Vaidosa

 Metáfora da Semana

Um sábio mestre e seu discípulo andavam país afora, havia dias. Os pés, embora acostumados ao pedregulho da estrada, já clamavam por um pouco de sossego. Procuraram então, num lugarejo simples, onde descansar durante a noite. Avistaram um casebre rústico no alto de um morro e resolveram pedir abrigo para passarem a noite. Ao chegarem, foram recebidos pelo dono, um senhor jovem, mas aparentando mais idade, maltrapilho e cansado. Convidados a entrar, foram apresentados à esposa e seus três filhos.

Durante o jantar, o discípulo percebeu que a comida era escassa até mesmo para somente os quatro membros da família e ficou penalizado com a situação. Olhando para aqueles rostos cansados e subnutridos, perguntou ao dono como eles se sustentavam e sobreviviam, mesmo porque, naquele lugar não havia sinais de pontos de comércio e de trabalho. O pai daquela família respondeu:

- Está vendo aquela vaquinha lá fora? É dela que tiramos o nosso sustento com a ordenha do leite que consumimos e fazemos queijo. O pouco de leite que sobra, trocamos por outros alimentos na cidade. Ela é nossa fonte de renda e de vida. Conseguimos viver com o que ela nos fornece.

O discípulo olhou para o mestre que jantava de cabeça baixa e  como nada fosse dito, terminou de jantar, também em silêncio.

Pela manhã, o mestre e seu discípulo se levantaram antes que a família acordasse e preparavam-se para ir embora quando o mestre ordenou ao seu discípulo:

- Aprendiz, pegue a vaquinha, leve-a ao precipício ali na frente e empurre-a, jogue-a lá em baixo.

O jovem discípulo arregalou os olhos assustado e questionou o mestre sobre o fato da vaquinha ser o único meio de sobrevivência daquela família, mas o mestre, calmamente replicou a ordem. E como percebeu que nada adiantaria ser dito, resignado foi cumprir a determinação do seu Mestre.

O discípulo indignado e contrariado, jogou a vaca precipício abaixo e ainda a viu morrer. Nunca mais se esquecera daquela cena triste.

O discípulo ainda sentia remorso pelo que havia feito e muitos anos mais tarde decidiu abandonar seu mestre e visitar aquela família. Queria contar o que houve, pedir perdão pela maldade e se redimir de alguma forma.

Assim fez, e quando se aproximava do local avistou uma casa enorme e muito bonita, com árvores floridas, com carros na garagem e algumas crianças brincando no jardim. Ficou triste e desesperado imaginando que aquela humilde família tivera que vender o sítio para sobreviver, "apertou" o passo e chegando lá, logo foi recebido por um caseiro muito simpático. Perguntou sobre a família que ali morava:

- Você sabe para onde foi à família que vivia no casebre que havia aqui?

- Sim, claro! Eles ainda moram aqui, estão ali nos jardins. – disse o criado, apontando para frente da casa.
 
O discípulo caminhou na direção da casa e pôde ver um senhor altivo, brincando com três jovens bonitos e uma linda mulher. A família que estava ali não lembrava em nada os miseráveis que conhecera tempos e tempos atrás.

Quando aquele senhor avistou o discípulo, reconheceu-o de imediato e o convidou para entrar em sua casa.

O discípulo quis saber como tudo havia mudado tanto desde a última vez que os viu. O senhor então falou:

- Depois daquela noite que vocês estiveram aqui, nossa vaquinha caiu no precipício e morreu. Como não tínhamos mais nossa fonte de renda e sustento, fomos obrigados a procurar outras formas de sobreviver. Descobrimos muitas outras formas de ganhar dinheiro e desenvolvemos habilidades que sequer imaginávamos ou sabíamos que éramos capazes de fazer. 

E continuou:

- Perder aquela vaquinha foi horrível, mas aprendemos a não sermos acomodados e conformados com a situação em que estávamos. Às vezes precisamos perder para ganhar mais adiante. Foi um difícil e ótimo aprendizado.

Só então o discípulo entendeu a profundidade do que o seu ex-mestre o havia ordenado fazer.

4 comentários:

  1. Só um mestre mesmo para ter a coragem de fazer algo assim e confiar.
    Bonito texto.
    beijos

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  2. Gilmar, antes de mais nada uma boa Páscoa. Sempre friso que quando eu perco, não vejo pelo ângulo da perda, mas do ganho adiante. Deixo o meu afeto.

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  3. Gilmar meu querido amigo, esta lição é sempre oportuna...acomodar-se nunca é a melhor escolha.
    A vida pede por ação, por atitudes, o universo é rico em possibilidades, mas infelizmente as pessoas as vezes precisam passar por situações similares de perdas, para mudar o rumo de suas vidas, aprender e expandir suas consciências.
    Tenha uma Feliz e abençoada Páscoa junto aos seus familiares e amigos.
    Fique na paz, te deixo meu abraço...
    Valéria

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  4. HOLA GILMAR! GRACIAS POR TU CÁLIDA VISITA A MI PANALITO. DESDE VENEZUELA MIS CARIÑOS. MARISELA:)

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