Meus Rabiscos
Agora é dizer sobre partidas e chegadas...
Opto então por pensar “partidas e chegadas”
enquanto processos evolutivos do ser, enquanto instâncias de refazimento de si
e de criação das novas metas, em constante processo "espiralado" de
reconstrução.
Essa evolução, por todos experimentada, talvez com
ponto de partida bem delineado, mas sem ponto final ou de chegada definido, por
conta também das involuções sofridas, é a trajetória natural de cada ser
humano.
A falta do ponto final nos remete à estrada sem
fim, à amplidão do rumo, onde o horizonte é tingido, aos nossos olhos, por
cores de nevoeiro, poeira, chuvas torrenciais, escuridão, reflexos de luzes,
enfim, são metáforas dos desafios a ultrapassar, das curvas montanhosas a
sobreporem declives e aclives acentuados, e tudo isso nas desconhecidas formas
e condições de prosseguir os passos.
Evolui-se entre tantas chegadas e tantas partidas,
por vezes concomitantes. Alguns param na chegada. Outros não querem mais a
partida. Alguns se aquietam nos pontos de descanso da estrada e não se pode
dizer que são menos felizes por isso. São escolhas. Optou-se por permanecer
naquele lugar, independentemente das limitações impostas. É que nem todos tem a
aptidão para explorar outros caminhos, a alma não é expedicionária e nela não
mora a curiosidade, nem tampouco a ousadia. Ou nada disso. Apenas se escolheu ficar...
Outros
são afoitos nas partidas. Não saboreiam a
chegada. Não permitem que os olhos descansem, por segundos sequer, nas
novas
paragens. Não apreendem, portanto não aprendem. O pensamento intuitivo
ignora o
convite reflexivo. Etapas são puladas. Esses também não são menos
felizes por
isso! Só há pressa. O olhar, talvez, esteja lançado adiante. Outras são
as escolhas. Também esses não são menos felizes por isso...
Outros
ainda enamoram-se das chegadas, tecem laços
emotivos para além do tempo permitido. Acomodam-se na intensificação do
sabor
experimentado. Lambuzam-se, em demasia. Adormecem nos braços
convidativos da
suposta felicidade que não reclama reforço, cuidados ou sonhos. O tempo,
quem sabe, um pouco mais adiante, vai exigir desses algum desapego e
releituras. E também não
são menos felizes por isso!
Há então os que titubeiam ante as escolhas de
partir ou de chegar. Há medo de partir, pois não se quer abrir mão do que já
tem. Há medo de chegar, pois o enfrentamento dos desafios vestidos de “novo e
desconhecido” faz desestabilizar a autonomia. Incertos dos passos e dos
rumos, acolhem os ditames de outros viajantes, muitos desses oriundos de
lugares inóspitos e inabitados por almas humanas. Incautos, sobrevivem à sombra
de si mesmos, desconhecendo dores aguçadas e sorrisos engrandecidos, por isso
respiram involução, num edema pulmonar prestes a subtrair-lhes a vida. Esses
sim, provavelmente são menos felizes por isso!
Ser feliz então, entre partidas e chegadas ou entre
chegadas e partidas, exige a capacidade de seguir adiante, com a humilde
consciência do aprender a aprender e do aprender a ser; do refazer-se, do
desconstruir e reconstruir-se, em permanente estado de alerta. É insistir nos passos,
ir com as mãos vazias e límpidas, dando sacudidelas nos entulhos não
recicláveis, revigorando-se e lançando fora o que já não serve mais. Seguir
evoluindo, não desconhecer as involuções, mas jamais fugir das escolhas.
E, se preciso for, vale o “metamorfoseio”
ambulante, já cantado por Raul: “... prefiro ser essa metamorfose ambulante,
do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo. Do que ter aquela velha
opinião formada sobre tudo. Sobre o que é o amor, sobre o que eu nem sei quem
sou...”
Publicado originalmente em 16 de outubro de 2010
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