quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Se eu fosse mulher por um dia...

Meus Rabiscos

Cupid's Arrow, de José de Almeida & Maria Flores


Se eu fosse mulher, por um dia, queria desconhecer o cansaço e a irritabilidade da rotina, nos afazeres de casa. Não conseguiria ser essa mulher multifunções, "multitudo". Essa mulher "prendada" não sobreviveria!

Queria navegar em descobertas esfuziantes e a primeira curiosidade seria sobre os "mistérios" que povoam o banheiro feminino. Saber porque se vai ao banheiro feminino em duplas ou tríades, o que acontece lá dentro e porque o retorno é sempre acompanhado de largos sorrisos na face. Talvez sejam os encantos do "espelho espelho meu", em meio a bolsas recheadas de surpresas. Talvez...

Outra sensação, que deve ser deliciosa para se descobrir, seria o uso despudorado do cartão de crédito. Essa moeda plástica, que tantos desatinos provoca, tem seus segredos revelados em sapatos, roupas e outras tantas sacolas de grifes. Deve ser fantástica a emoção compulsiva das compras! Loja após loja, num infindável movimento de despir e vestir, até o "é esse"! Mais uma relíquia para o closet.

De outras tantas eu fugiria. Depilação então, nem pensar! Precisaria ser sofisticada, a laser ou qualquer outra tecnologia indolor. Nada de stress! Nada de baixas na autoestima!

De algumas não abriria mão: perfumes marcantes, hidratantes rejuvenescedores, peelings revigorantes, silhueta justa e contornos de violão, uma sereia que não exigisse dietas mirabolantes. Comer sem culpa, viver sem culpa! Por um só dia é até imaginável!

O melhor seria mesmo descobrir o "secreto" das falas, das conversas informais, dos segredos femininos discutidos sem receios, entre iguais. Saber tanto das dores quanto do êxtase! As aventuras inconfessas, as ousadias e transgressões segredadas.

Mas ser mulher, por um só dia, não seria apenas deliciar-me em futilidades da moda, medidas do corpo, pernas torneadas, bumbum enrijecido, pele delicada, cabelos tratados, cosméticos milagreiros e tantos outros "apetrechos" admoestadores do necessário embelezamento. Xô celulites, Xô estrias, Xô culotes. Por um só dia dá prá ficar sem tudo isso!

Ela também é espiritualizada, batalhadora, racional, ímpar. Eu seria então uma mulher superpoderosa, fazendo escolhas de felicidade, não as malogradas. Num só dia dá prá apostar nessas possibilidades.

Todas essas questões de ordem profissional, social e familiar, não seriam tão impossíveis de contornar, afinal, só um dia, passa rápido demais. A enxaqueca nem conseguiria se aproximar.

O grande problema seria controlar a libido. Ah, este seria um problema desastroso a se resolver. É que, enquanto mulher, ainda que só por um mísero dia, não me desvencilharia do meu lado "gay"!

"Arrgggg"! Homens? Nem pensar! Coisa mais esdrúxula, mais repugnante! Os trejeitos arrogantes, a empáfia de conquistadores, o machismo "imbecilóide", os hábitos constrangedores. Não! Isso já seria sacrificante, ultrajante até! Melhor revigorar o meu lado "gay", enquanto mulher!

O lado masculino, na mulher por um só dia, seria o imperativo a não escapulir dos traços. E ele é tão forte, tão encantado pela mulher, que mesmo em sua pele, seria impossível não se perder na beleza do olhar, no desenho dos lábios, no contorno da face, no convite dos olhos, na sedução do andar e no desejo que faz exalar!

Se eu fosse mulher, por um só dia, haveria de fazer sobreviver e sobrepor a todos os outros, a todo custo, o meu lado "gay"! Seria impossível, insípido e intragável imaginar diferente! 




Publicado originalmente em 28 de junho de 2010

Um comentário:

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