segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Uma Carta

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Não raramente, folheando jornais velhos encontramos coisas curiosas. Ainda agora, passando os olhos sobre um número do "Jornal des Devats", de muitos anos passados, lemos uma circunstância notícia sobre um documento interessante encontrado na biblioteca dos lazaristas em Roma. É uma carta dirigida a César, por Plubius Lentulos, governador da Judeia predecessor de Poncio Pilatos; ou antes, como definiu o "Jornal", a ficha de Jesus Cristo redigida na época em que o Salvador começava as suas prédicas.

A título de curiosidade reproduzimos o importante documento que, uma vez posto fora de dúvida como foi, sua autenticidade constitui decerto o mais precioso texto que nos podia ser transmitido pela antiguidade:

"O Governador da Judéia,Publius Lentulos, ao César Romano:

—Soube, oh César! que desejavas informações acerca desse homem virtuoso que se chama Jesus Cristo, que o povo considera um profeta e os seus discípulos o filho de Deus, criador do céu e da terra.

Com efeito, César, todos os dias se ouvem contar dele, coisas maravilhosas. Numa palavra, ele ressuscita os mortos e cura os enfermos. É um homem de estatura regular, em cuja fisionomia se reflete tal doçura e tal dignidade que a gente se sente obrigada a amá-lo e a temê-lo ao mesmo tempo.

A sua cabeleira tem, até as orelhas, a cor das nozes maduras e daí até os ombros tinge-se de um louro claro e brilhante; divide-a uma risca ao meio, à moda nazarena, a sua barba da mesma cor da cabeleira é encaracolada, não longa e também repartida ao meio. Os seus olhos severos tem o brilho de um raio de sol, ninguém o pode olhar em face. Quando Ele acusa ou verbera inspira o temor, mas logo se põe a chorar. Até nos rigores é afável e benévolo. Diz-se que nunca ninguém o viu rir, mas muitas vezes derramar lágrimas. As suas mãos são belas como os seus braços. Toda a gente acha a sua conversação agradável e sedutora. Não é visto amiúde em público, e quando aparece apresenta-se modestíssimamente. O seu porte é muito distinto. É belo. Sua mãe é, aliás, a mais bela das mulheres que já se viu neste país. Se o queres conhecer, oh César, como já uma vez me escreveste, repete a  tua ordem e eu to mandarei.

Se bem que nunca houvesse estudado, esse homem conhece todas as ciências. Anda descalço e de cabeça descoberta. Muitos riem quando ao longe o enxergam; desde que, porém, se encontram em face Dele tremem e admiram-no. Dizem os hebreus que nunca viram um homem semelhante, nem doutrinas iguais às suas. Muitos creem que Ele seja Deus, outros afirmam que é teu inimigo, oh César. Diz-se ainda que Ele nunca desgostou ninguém, antes se esforça por tornar toda a gente venturosa."



Publicado originalmente no "Correio da Manhã", em maio de 1916, com a colaboração de Raul A. Brasil. 
Republicado no "Almanaque Goulart", página 42, em janeiro de 1959.



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