segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Trocadilhos I

Meus Rabiscos
Chorar o Leite Derramado
O arrependimento é implacável, quando a índole nutre-se de verdades e ética. A nossa humana propensão ao erro é fato, ocorre em razão das crenças cultivadas e nem sempre se revela mesquinha, má, vil. Ocorrem enganos, escorregadelas involuntárias quase, mas que ferem, que machucam.

A atitude a ser emprestada é, primeiro, o perdão a si mesmo. Saber reconhecer-se imperfeito e aprender na imperfeição a reconstruir-se melhor. Depois, é preciso humildade para o reparo exigido. Humildade significando "esvaziamento de si" , enquanto ausência de concepções prévias, de verdades intactas e absolutas. Significa a mais profunda e íntima manifestação de reconhecer-se na imperfeição, sua e do outro. É preciso ir em busca disso. É preciso não estagnar-se, em si mesmo, ou encismesmar-se na arrogância. Percorrer, solitário, o vale das lamentações em nada contribuirá, em nada modificará o que posto está. Implica então em assumir, na totalidade, o seu próprio tamanho.
Encher Linguiça
As falas grandiloquentes nem sempre guardam coerência e nem sempre revelam verdades. Há máscaras que falseiam, apenas ajudam na performance das interpretações fantasiosas e equivocadas no palco da vida. Não é difícil lidar com "falas" dessa natureza, se externas a cada um. Difícil é lidar com esses "textos" construidos prá dentro, digeridos no confuso exagero da autoestima, em verdade autosuficiência. É quando o vazio existencial se torna um lugar lúgubre, tenebroso, solitariamente assustador. Quanto mais se tenta alcançar a aceitação, a reputação ou a glória, tanto mais de "nada" o vazio se encherá.

A atitude, primeira, é a da paciência consigo mesmo. Dosar a ansiedade da fala, dos gestos ou das fanfarrices. Depois, é exercer a tolerância em relação ao que partilha. É preciso esforço para compreender as vicissitudes e idiossincrasias no círculo de relações. Mais uma vez as imperfeições se revelam carentes. A empatia, tão árdua na aplicação, merece ser visitada e concedida. Os exercícios de descoberta, na aventura da reinvenção de si mesmo, passam a ser o programa predileto na dimensão humana. Embrenhar-se na selva das contradições, dos pesadelos do ser e das incompletudes desnorteantes, permitirá revisar-se por inteiro e alocar outros signficantes no espaço não mais vazio. Em processo.
Engolir Sapo
Atire a primeira pedra aquele que nunca se "explodiu" de contrariedade. E reprimi-la é o pior dos remédios. Não há coração que aguente e nem estômago que resista. Por vezes o insulto, a humilhação, o sarcasmo, o escárnio, o mandonismo exacerbado, a prepotência, o jogo de poder, enfim, inúmeras situações nos retiram dos trilhos e sem pestanejar, já desferimos respostas que agigantam o estrago. Ou então, vem a acomodação, e os sapos passam a ser digeridos na constância da passividade. O organismo se acostuma a não mais vomitá-los e a não mais expelí-los. As escolhas impõem riscos de toda sorte.

A atitude a ser proposta é a da resistência consciente, da dignidade que não se vende, da firmeza de propósitos edificados na ética. Ainda assim, quando preciso, dar a face à bofetada é um ensinamento a não ser esquecido. A ignorância, se revidada, vira lugar comum, que não mais diferencia, não mais distingue. A resignação é o exercício da bondade, e muitas vezes da caridade. Entretanto, hostilizar a prepotência ou solapar a si mesmo, ante o enfrentamento da injustiça ou opressão, só fazem imperar o caos que sustenta o egocentrismo humano.  Hora de arrefecer os ânimos, recobrar a calmaria, concentrar-se na exuberância que reside em si mesmo e tratar, com serenidade, os descompassos.
Pagar o Pato
Responder por ações ou irresponsabilidades de outros é sofrer consequências dolorosas e incabíveis. Quantas e quantas vezes somos vitimados por "senhores do poder" que corrompem, se enriquecem nas masmorras da miserabilidade do povo e ao mesmo povo retornam com retórica afiada, a rir de tamanha e esquálida benevolência. "Senhores" que não aparecem nem na  "Voz do Brasil", mas que se infiltram nos porões do poder e com astúcia vilipendiam a boa fé. Por fim, vencem instituições já falidas, escamoteiam projetos reclamados, zombam da dignidade e fazem triunfar nulidades. E cada um paga o preço da distância que permitiu abrir.

A atitude não é outra senão indignar-se, na prática. Não é outra, senão gritar basta. Não é outra, senão fazer valer a cidadania e expelir, da democracia, esses intragáveis gatunos bem vestidos na mordomia do poder. É preciso repudiar o cabresto, jogar ao chão a sela imposta e extirpar, vez por todas,  as viseiras que retiram a vida da visão sistêmica e integral da realidade. Se a ausência de educação, e a criticidade por ela despertada, é apontada como responsável pelo cenário, então já é tempo de ressuscitar, em cada um, o cidadão que não se deixa enganar, não aceita o "arreio" e não tolera mais a rédea, para então propagar uma nova ordem, uma nova possibilidade, ou quem sabe até uma nova utopia. Importa que não se cale. Que não se submeta ao jugo. Que não se deixe corromper.
Fotos: google 
Publicado originalmente em 04 de julho de 2010

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